quinta-feira, 28 de maio de 2015

A vida secreta de William Shakespeare


O dia 23 de junho é uma das mais jubilosas – e tristes – datas na história literária. É o dia que, em 1564, William Shakespeare nasceu (se você concordar com a razoável suposição de que o nascimento dele precedeu o batizado em três dias), bem como o dia em que morreu, 52 anos depois. 

O dia 23 de abril de 1616 é também a data da morte de Cervantes, mas certamente até mesmo o autor de Dom Quixote teria aceitado de bom grado ser relegado a segundo plano por um homem considerado o maior escritor de todos os tempos.

Shakespeare não nasceu exatamente em uma família ilustre. Seu pai, John, era um próspero fabricante de luvas que às vezes tinha problemas com a lei. Ele foi multado por manter grande quantidade de estrume na frente da casa da família e processado por vender lã no mercado negro. 

Tendo sido uma vez um vereador respeitado, o Shakespeare mais velho viu seu status social declinar gradualmente a um ponto em que sua requisição para um brasão da família foi rejeitada pelo College of Heralds (Congregação de Arautos). Tempos depois, William Shakespeare teria sucesso onde seu pai falhou, escolhendo o lema Non sanz droit (Não sem direito), o que sugere que ele ainda estava furioso pela maneira como o pai fora tratado.

Os detalhes sobre os primeiros anos de vida do bardo são vagos. Aos dezoito anos ele se casou com Anne Hathaway, de vinte e seis anos, que estava grávida de pelo menos três meses no dia do casamento. Em 1585, os Shakespeare já haviam acrescentado gêmeos à família. Por volta dessa época, Shakespeare some do mapa, por assim dizer. 

Há especulações abundantes quanto às suas atividades durante os sete anos seguintes. Alguns dizem que trabalhou como escrivão, jardineiro, cocheiro, marinheiro, tipógrafo ou agiota. Supõe-se até mesmo que tenha passado algum tempo como monge franciscano. Provavelmente jamais conheceremos a verdadeira história.

Shakespeare retorna aos registros históricos em 1592, quando um colega dramaturgo o denuncia na imprensa como sendo “um corvo arrogante, embelezado com as nossas penas”. A observação maldosa indica que o jovem Will já havia alcançado certa medida de sucesso em Londres. Embora as suas primeiras peças talvez pareçam um tanto toscas atualmente, faziam enorme sucesso na época. A renda de bilhetes de comédias lascivas como A Comédia dos Erros e tragédias sangrentas como Titus Andronicus possibilitou que Shakespeare tivesse uma vida de senhor feudal, um objetivo a que ele sempre aspirou.

Ele virava e mexia com negócios imobiliários, emprestava dinheiro a juros e processava para receber de volta, e comprou ações de participação do Globe Theater que ajudaram a transformá-lo num homem rico. Também traía a esposa impunemente, fazia gato-e-sapato dos cobradores de impostos e em geral agia como um homem intocável tanto pela lei quanto pela moralidade burguesa. Não é de admirar por que amamos tanto esse sujeito?

A vida era boa para Shakespeare quando ele se aposentou e retirou-se em sua propriedade em Stratford em 1613, e tem sido boa para ele, no que se refere à reputação literária, desde então. É claro que ainda existe aqueles que afirmam que alguém com tal origem humilde e educação um pouco menos do que estelar não poderia ter escrito peças tão brilhantes, mas em sua maioria estes são malucos como Samuel Taylor Coleridge, Henry James, Charles Dickens, James Joyce e Sir Jonh Gieguld, para nomear apenas uns poucos.

Há até quem afirme que a Rainha Elizabeth I escreveu as peças de Shakespeare, embora como ela conseguiu continuar escrevendo-as depois da sua morte em 1603 ainda permaneça um mistério. O verdadeiro Shakespeare viveu até 1616, quando adoeceu – possivelmente depois de uma bebedeira – e faleceu com a avançada (na época) idade de cinquenta e dois anos.

O que há em um nome?


Como qualquer pessoa que já tenha tentado soletrar algo como “plougth thrugh a trough” poderá lhe dizer, a ortografia em inglês é notoriamente irregular. Na época de Shakespeare era ainda mais caótica. Como resultado, existem mais de oitenta e três maneiras igualmente válidas de se soletrar “Shakespeare”. Shagspere e Shaxberd são apenas duas das mais exóticas.

Até mesmo o próprio bardo tinha dificuldades em manter o sobrenome correto. Ele o assinava de, no mínimo, seis maneiras diferentes e com uma grafia cada vez mais errática: Shackper (num depoimento em 1612), Shakspear (numa escritura de 1612), Shakspere (numa hipoteca de 1612), Shackspere (na primeira página de seu testamento de 1616) e, finalmente, Shakespeare (na página 3 do, você adivinhou, seu último testamento). Pelo menos ele foi chegando mais perto a cada vez mais que assinava.

Um dia da caça...


Seria o poeta e dramaturgo mais armado da Inglaterra um ladrão sórdido e desprezível? Conta a lenda popular que em algum momento dos anos 1580 o jovem Shakespeare foi preso por caçar veados na propriedade de um poderoso magistrado chamado Sir Thomas Lucy. 

Pouco depois da morte de Shakespeare um clérigo de Gloucestershire chamado Richard Davies escreveu que, quando jovem, o dramaturgo era “muito dado a todo malogro no roubo de carne de veado e coelho” e que Lucy “com frequência ordenava que ele fosse açoitado, às vezes encarcerado e, finalmente, o expulsou da sua terra natal, para seu grande avanço”.

Qualquer que tenha sido o motivo, Shakespeare realmente mudou-se de Stratford para Londres por volta dess época. Talvez ele até tenha conseguido certa dose de vingança contra o seu perseguidor. Diz-se que o personagem da Frívola Justiça em As Alegres Comadres de Windsor e Henrique VI, Parte 2 é uma caricatura sutilmente velada de Sir Lucy.

Tributo nele!


Em 1597, Shakespeare já estava “bem de vida” pelos padrões da época. E, ao que parece, havia descoberto a estratégia tradicional dos ricos para manter a riqueza: fraudar o imposto de renda. O bardo está registrado como defraudador nos Anais da Agenda de Subsídios do Rei (King’s Remembrancer Subsudy Roll) daquele ano.

Três anos depois, seu débito aparentemente não havia sido pago. Um registro de impostos de 1600 indica “uma cobrança de impostos de 13s.4d. ainda pendente” e se refere às dívidas do dramaturgo as Bispo de Winchester, cuja jurisdição incluía a mais conhecida prisão de devedores de Londres.

Documentos subsequentes demostraram que Shakespeare – ou alguém agindo em seu favor – acabou saldando a dívida.

O verdadeiro Shylock


Shakespeare pode não ter quitado suas próprias dívidas, mas insistia para que as outras pessoas cumprissem essa obrigação nos prazos. Um agiota “pão-duro”, o bardo era conhecido por fornecer capital a amigos necessitados “por uma pequena taxa”. “Se você negociar com o sr. Shakespeare”, o pai de seu futuro genro certa vez comentou, “leve seu dinheiro para casa se puder”.

Shakespeare era famoso por levar os devedores ao tribunal para cobrar dívidas não pagas, mesmo se as quantias fossem pequenas. Ainda pior, ele era um sovina de grandes proporções. Jamais gastava um centavo com os habitantes pobres de Stratford e era notório por armazenar grãos e malte durante as épocas de escassez.

Os acadêmicos ainda estão debatendo se a cláusula do testamento de Shakespeare que deixa para sua viúva a “segunda melhor cama” do casal seria um gesto de afeição ou no último giro no parafuso de um “pão-duro” moribundo.

Filho de Will?


Filhos bastardos desempenharam papéis importantes em diversas peças de Shakespeare, portanto não é de surpreender que ele próprio tenha gerado alguns. O dramaturgo passava a maior parte do tempo em Londres, deixando a esposa Anne Hathaway em Stratford, cuidando dos filhos.

Quando viajava em visitas para casa, passava pela cidade de Oxford, onde frequentemente se hospedava numa taverna de propriedade de Jonh Davenant, um rico taberneiro. Davenant tinha sua própria e graciosa esposa, Jane, e, bem, dizem as más línguas que ela e Billy Shakes “botavam pra quebrar”.

O filho de Jane, chamado – ahã – William Dabenant, nasceu em fevereiro de 1606. Shakespeare foi padrinho da criança. Conforme o menino crescia, foi desenvolvendo várias e impressionantes similaridades com o suposto progenitor.

Will Davenant tornou-se um respeitado dramaturgo, diretor de teatro e poeta, tanto que foi nomeado o poeta laureado da Inglaterra em 1637. Até mesmo colaborou com Jonh Dryden numa nova versão de A Tempestade, em 1667.

Sobre Davenant, Samuel Butler certa vez observou: “Parecia-lhe que ele escrevia com o mesmo espírito de Shakespeare, e parecia satisfeito em ser chamado de filho dele”. Com a falta de um exame de DNA, possivelmente jamais saberemos a validade da afirmação.

Cheguei primeiro

Um esperto Shakespeare certa vez derrotou seu amigo e companheiro de palco, Richard Burbage, num romântico encontro com uma jovem dama que morava perto do teatro. O bardo entreouviu os dois fazendo planos para um encontro secreto. “Anuncie-se como Ricardo III”, ela disse ao ator.

Pensando rápido, Shakespeare apressou-se até a casa da jovem, forneceu a senha combinada na porta e foi admitido aos aposentos dela para uma ardente e estimulante sessão. Quando Burbage apareceu, poucos minutos depois, Shakespeare saíra e lhe deixara um recado: William, o Conquistador, chegou antes de Ricardo III.

Bi ou qualquer outro nome

Que Shakespeare era um sujeito um tanto libertino é incontestável. Afinal, ele realmente dedicou vinte e seis sonetos de amor carregados de erotismo a uma desconhecida mulher casada, nomeada apenas como Lady Dark. Mas será que o poeta romântico mais reverenciado do mundo ocasionalmente jogava no outro time?

Os acadêmicos continuam discutindo se Shakespeare seria ou não bissexual. Os que apóiam a idéia apontam para os 126 outros sonetos que ele escreveu para um homem, conhecido apenas como Belo Jovem ou Belo Senhor (Fair Youth – Fair Lord).

A única edição dos sonetos publicada durante o seu tempo de vida é dedicada ao misterioso “Sr. W. H.”.

E, em seu testamento, Shakespeare legou quantias em dinheiro aos seus amigos John Heminges, Richard Burbage e Henry Condell expressamente para que comprassem anéis memoriais para comemorar a sua estreita amizade.

Esse tipo de evidência tem alimentado as ruminações dos acadêmicos há décadas.

Parentes Vergonhosos


Como muitas figuras públicas proeminentes, Shakespeare carregava nas costas a sua parcela de parentes constrangedores – ninguém menos do que o seu genro baixo-nível, Thomas Quiney.

Um desbocado proprietário de taverna que certa vez quase foi processado por vender vinhos estragados, Quiney não poderia ser pior como pretendente à mão da filha de Shakespeare, Judith.

No entanto, Shakespeare não se opôs à união e os dois se casaram no dia 10 de fevereiro de 1616, apenas dois meses antes da morte do bardo. O bolo de casamento mal começara a azedar quando Judith descobriu que Quiney estava dormindo com outra mulher. Foi um escândalo em Stratsford. O próprio Shakespeare apressou-se em tomar providências para modificar o testamento e excluir Quiney completamente.

No dia 26 de março o taberneiro mulherengo foi condenado por ter realizado “cópula carnal”. Foi ordenado a executar a penitência em público, embora mais tarde a sentença tenha sido modificada para uma pequena muita e penitência privada. O sórdido incidente serviu de combustível para a especulação de que Shakespeare foi assassinado pelo próprio Quiney, como retribuição por tê-lo privado da herança. Entretanto, nenhuma evidência séria já foi apresentada para sustentar essa teoria.

Bardo Rígido

A fim de dissuadir os coveiros a violar seu túmulo e atirar seus restos mortais numa capela mortuária (como era costume na época), Shakespeare deixou uma praga em sua tumba. O seguinte epitáfio foi inscrito:

Bom amigo, pelo amor de Jesus, abstenha-se 
De cavar o pó aqui encerrado!   
Abençoado o homem que poupar estas pedras
E amaldiçoada seja aquele que mover os meus ossos.

Alguns acadêmicos já sugeriram a possibilidade de exumar os restos mortais de Shakespeare, seja para analisar a ossada para determinar qual teria sido a aparência dele, seja para confirmar os rumores de que ele foi enterrado com um depósito secreto de obras-primas não publicadas.

Até agora, contudo, ninguém conseguiu juntar coragem suficiente para desafiar a maldição do bardo.

Lendas e Mitos


Juntamente com a eterna controvérsia sobre quem “realmente” escreveu as peças de Shakespeare, diversos mitos pitorescos germinaram acerca da vida e da carreira do dramaturgo.
Uma das lendas mais persistentes afirma que Shakespeare contribuiu na redação da Bíblia de King James. Supostamente, se você pegar o Salmo 46 e contar 46 palavras no início e 46 palavras no final, chegará às palavras shake e spear. (O que isso prova, cabe a qualquer um imaginar.)
Outra lenda diz que Shakespeare era, na verdade, um nobre italiano chamado Michelangelo Crollalanzo (o nome se traduz, em inglês, para “shake spear”) que fugiu para a Inglaterra aos vinte e quatro anos a fim de escapar da Inquisição Espanhola.
Barnum e o Barbo
A cada ano milhares de pessoas afluem a Stratsford-upon-Avon para visitar o local de nascimento de Shakespeare. Se o empresário de circo norte-americano P.T. Barnum tivesse conseguido o que queria, o chalé onde Shakespeare nasceu poderia estar situado no terceiro picadeiro, ao lado do elefante dançante e do menino com cara de cachorro.
Na década de 1850, Barnum ficou tão consternado com o péssimo estado da estrutura (parte da casa estava sendo usada como açougue) que tentou comprá-la pretendendo despachá-la para os Estados Unidos para que fosse exibida.

Porém, antes que ele conseguisse completar a aquisição, o governo britânico, justificadamente constrangido, intercedeu e designou a propriedade como monumento nacional.

quarta-feira, 27 de maio de 2015

ABC do Fausto Wolff (Parte 82)


ZALTYS – A letra Z é muito popular nos países balcânicos e está no sobrenome de uma porrada de poetas do século XIX que ninguém conhece. Tem pouco a ver com o esporte que, mal ou bem, explica a nossa existência. Cheguei a pensar em apelar e botar o Zorro. Acontece que o Zorro, que dava pro índio Tonto, em verdade só era Zorro aqui no Brasil. No resto do mundo o nome do marmanjo que usava uma máscara negra era Lone Ranger. O Zorro que agia na Califórnia tinha um irmão gêmeo viado, segundo recente versão hollywoodiana, mas... Ah, deixa pra lá que o verbete é Zaltys.

Zaltys é uma cobra verde inofensiva, mas altamente respeitada nas antigas religiões bálticas. Para assegurar saúde e fertilidade na família, cada casa, principalmente na Lituânia, tinha uma cobra verde dessas num canto da cozinha. Volta e meia a família se reunia e adorava a cobra.

Se Freud fosse vivo, imaginem quantas ilações sacanas tiraria deste ingênuo culto primitivo! 

Às vezes a cobra era convidada a jantar  com a família. Se ela se recusasse, a desgraça era iminente: as plantas se recusavam a crescer, o leite talhava, o chefe da casa brochava e, naturalmente, não nasciam mais filhos.

Os russos botaram na poupança dos lituanos porque pegaram eles desprevenidos: as cobras verdes estavam em falta.


ZAPATA, Emiliano (1879-1919) – Vocês achavam que eu ia deixar  ele escapar? Líder revolucionário mexicano que começou como camponês guerrilheiro em Morelos, onde nasceu. Ajudou Francisco Madero (“Poco trabajo, mucho dinero, pulque barato, viva Madero!” e vocês já viram que, com uma canção dessas, a revolução só podia dar no que deu) a derrubar o tirano Porfírio Dias em 1911. 

Zapata foi perguntar a Madero, acabada a revolução, quando ele pretendia distribuir a terra aos camponeses. Madero respondeu como Sarney: “Tu estás levando esta tal de reforma agrária muito a sério”. 

Foi o bastante para Zapata recomeçar a revolução com o lema “Terra e Liberdade”.
Madero caiu em 1913 e foi substituído por outro ditador, Vicente Huera, que Zapata também botou pra correr com a ajuda de Pancho Villa.

Como todo cara pobre que luta contra o poder, foi traído e assassinado, em 1919.

Aliás, não só em 1919.

Segundo Elia Kazan em seu filme Viva Zapata!, na noite de sua lua-de-mel, em vez de mel teria pedido a sua noiva que o ensinasse a ler. Não fez o que as pessoas normais fazem com as noivas.

Por outro lado, o Elia Kazan também não é de confiança, haja visto que dedurou atores e diretores esquerdistas para o senador MacCarthy, mas isso é outra história.


ZEUS – Filho mais novo de Cronos (Tempo, daí cronômetro), que tinha mania de comer literalmente os seus filhos, como, aliás, o tempo faz com todo o mundo. O tempo é um grande mestre, mas mata seus alunos antes que eles aprendam a lição.

Cronos, que havia castrado o próprio pai (Urano), foi vencido por Zeus, já crescidinho, que tomou conta do Olimpo. Deu o inferno para seu irmão Hades e o mar para seu irmão Poseidon e aproveitou para casar com a irmã, Hera.

Ao contrário de religiões anteriores e posteriores, os gregos humanizaram ao máximo o seu deus supremo.

Zeus era um pai de família justo, mas passível de cometer erros motivados por paixão; era tremendamente galinha, mas acabava sempre perdoado pela irmã-mulher que, porém, era extremamente vingativa com as amantes eventuais do marido; tinha pavio curto mas sua ira podia ser apaziguada e, principalmente, tinha muito senso de humor.

Seu nome deriva provavelmente de uma raiz que significa “brilhante”, pois é o deus do céu e dos fenômenos atmosféricos.

Em algumas lendas ele aparece como marido de uma porrada de deusas, mas como os gregos eram monogâmicos, acabaram por amarrá-lo a Hera, o que não o impediu de comer quem quisesse.

Para conquistar mulheres e deusas, às vezes se disfarçava de cavalo, touro, chuvinha de prata.

Trepou com Metis, a deusa da sabedoria, com a qual, segundo Hesíodo, teve Atena. Outras lendas dizem que Atena já nasceu adulta e armada do cérebro de Zeus.

Com Demetér teve Perséfone; com Leto teve Apolo e Ártemis; com Hera teve Hebe, Ares e Eileitiia; com Maia, filha do gigante Atlas, teve Hermes.

Mulheres mortais comeu as que quis, na conversa, na marra ou no disfarce. Com Semeie teve Dionisos, com Alcmene teve Héracles, com Leda (disfarçado de cisne, daí a expressão “afogar o ganso”, para os comuns mortais, pois Zeus afogava o cisne) teve Helena, Clitemnestra, Castor e Polideuces, com Io teve Êpafos, com Europa teve Minos e Radamantis, com Antíope teve Anfion e Zetos. Chega? É que tem muito mais.

Como era (é?) imortal podia ter um filho com uma mulher e, posteriormente, cem anos depois, ter outro filho com a tetraneta desta mesma mulher, que assim seria irmã de sua própria trisavô.

Verdade é que suas  uniões com mulheres mortais correspondia ao desejo de certos reizinhos de serem descendentes dele.

Zeus era o dispensador do bem e do mal no destino das criaturas humanas, mas principalmente do bem.

Era o regulador do curso dos acontecimentos, conhecia o futuro que, eventualmente, revelava através de oráculos.

Era ele quem aplicava a justiça e punia a calúnia, além de ser o defensor da casa e da liberdade.

Seu poder só não é ilimitado porque é obrigado a obedecer aos caprichos do destino.

Pessoalmente, não me considero ateu, pois acredito em Zeus, que nunca botou cobra alguma em paraíso algum.


ZOLA, Emile (1840-1902) – Bem mais sacana que o falecido Zola, foi o vivíssimo Carlos Zéfiro. Autor de histórias em quadrinhos de sacanagem, seus desenhos não são grande coisa e seu texto não é melhor. Em compensação, quebrou o galho de adolescentes desde 1950, quando seus livrinhos começaram a aparecer. 

Homem que nasceu entre 1940 e 1950 e não bateu uma punheta vendo as histórias do Zéfiro ou era cego ou doente do pau. 

Ninguém sabe a verdadeira identidade do Carlos Zéfiro que, por sinal, é mais misterioso que o B. Traven, o maior escritor norte-americano da primeira metade do século XX, autor de O Tesouro de Sierra Madre.

Mas voltando ao Zola, ele não era sacana e está aqui porque impediu uma grande sacanagem que queriam fazer com um tenente judeu chamado Alfred Dreyfus.

Há quem diga que Dreyfus quer dizer tripé. Mas ninguém sabe nada sobre o tamanho da rola do tenente, pois tripé era o seu nome mesmo.

Tripé no duro era o jogador de futebol que, apesar de se chamar Germano, era crioulo. Um dia a contessina Agusta foi ver um treino de futebol do Fiorentina (se não me engano) e teve a impressão de que o Germano tinha três pernas.

Se apaixonou pela perna do meio e se casou com ele, apesar da grita da família, uma das mais ricas da Itália. Quando encheu o saco do Germano, a contessina pediu o divórcio e o burro do Germano, que até teve uma filha com ela e podia ter pedido aos tubos do velho conde que, afinal, era ladrão, aceitou os termos impostos pela justiça italiana e voltou para o interior de Minas onde vive sem um tusta. Na Itália era conhecido como Germano Tre Gambe.

Mas voltando ao Dreyfus. Ele fora acusado de traição injustamente pelo governo francês. Zola escreveu o seu célebre J'Accuse (em alguns países a imprensa já servia para alguma coisa mesmo no século XIX) e o militar acabou sendo libertado da ilha do Diabo.

Zola era gordo, tinha mais de 110 quilos e menos de 1,60 m, além de ser desdentado. Não trepou muito e com este physique de rôle que só perde para o Adolph Bloch, não podia querer grande coisa.
Em compensação, suas descrições do ato sexual em Nana e Pat-Bouille foram tão realistas que influenciaram o curso da literatura ocidental.

Morreu aos sessenta e dois anos com uma mulher e uma amante com quem teve duas filhas.

Aos doze anos foi comido por um empregado turco chamado Mustapha, mas ao contrário de Lawrence, que também entregou o anel de couro para um turco, Zola não gostou.

Considerou a vida inteira uma sacanagem o que o Mustapha fez com ele.


ZOOFILIA – Como os mais inteligentezinhos sabem, não quer dizer amizade aos animais, mas “uma certa inclinação” para os animais. Os zoófilos mais moderados limitam-se a ver os animais fuque-fuque, segundo o nobre estilo de O Dia. É que, anos atrás, o redator-chefe, furioso, rasgou o título de uma matéria: “Tarado enrabou o porco”. Substituiu-o por “Tarado enrabou o suíno”.

Aliás, este cinéma-cochon ou cinéma-cheval é tão comum em todas as regiões rurais do mundo que só um cretino o classificaria de perversão.

Há ainda os zoófilos que não se limitam a olhar. A perigo, traçam suas vaquinhas, porcas, éguas, etc. Mas só a perigo.

Segundo o velho Kinsey, mais de 40% dos rapazes habitantes do campo tiveram algum contato sexual com animais na fase pré-adolescente e adolescente. É o chamado quebra-galho.

Perversão mesmo, no caso, é o bestialismo. Bestialismo, como vocês sabem, é o cara que só encara uma mulher quando não tem uma cabrinha à mão.

Embora na Idade Média o sujeito que fosse apanhado botando na olhata de um bicho qualquer corria o risco de acabar na fogueira, hoje em dia ninguém dá grande importância ao bestialismo, desde que praticado com discrição.

Pessoalmente, desaconselho os leitores a induzirem animais à prática do felacio. Uma mordida e AAAAIIII!

As lagostas e as polvas são mais ternas e compreensivas.

Eu poderia ainda falar dos zéfiros, uns ventos brincalhões que adoravam levantar as tules das ninfas dos bosques gregos ou dos zannis, personagens cômicos da Commedia dell'Arte; de Maria Zayas, escritora espanhola de novelas eróticas do século XVI ou das Ziegfield Girls, que mostravam as coxas nos palcos de New York nos anos 10 e 20.

Mas a luz apagou, meus fósforos acabaram e enchi o saco de procurar safadezas para satisfazer a curiosidade mórbida de um bando de relambórios safardanas. Acabou, chega, vão pra casa! Vocês são muito doidos!

ABC do Fausto Wolff (Parte 81)


YEVTUCHENKO, Yevgeni Aleksandrovich (1933- ) – Poeta, se tornou líder da juventude russa depois da morte de Stálin, ocasião em que caiu de pau no falecido ditador. Viajou pela Europa Ocidental e Estados Unidos como garoto-propaganda de Kruschev. Caiu em desgraça em 1963 quando publicou sua autobiografia. Alguém devia lhe ter dito que a autobiografia era precoce demais.

De qualquer modo, foi reabilitado em 1967, quando publicou seu ciclo de poemas Estação Bratska.

Nos anos 70 andou meio desaparecido e eu já estava pensando em escrever um conto chamado “Whatever happened with Geny Tuchenko?” quando ele pintou aqui no Rio de Janeiro em 1987.

Não é um grande poeta, mas passei a gostar mais da poesia dele depois que me disseram que, apesar dos insistentes pedidos dos poetinhas locais para discutir literatura, Yevtuchenko só queria saber de tomar cana.

Aparentemente, por onde passou, não sobrou puta pobre. Quem diz que só se faz poesia escrevendo?


YING-YANG – A cidade gaúcha de São Borja, onde nasceram Getúlio Vargas e João Goulart, é uma homenagem a um santo italiano chamado Bórgia que teve muitos filhos – alguns deles, papas – que, por sua vez, tiveram muitos filhos. Apesar disso, apenas agora – e muito reticentemente – a Igreja admite que o ato sexual pode ser praticado por outros motivos que não os puramente reprodutivos. Motivos recreativos, digamos.

Dois mil e quinhentos anos antes de Cristo, os religiosos chineses já haviam descoberto este segredo de polichinelo. (Não, não se trata de um chinelo para usos múltiplos, mas sim o nome aportuguesado de Pulcinela, personagem da Commedia dell'Arte, cujos segredos eram de conhecimento público).

Ying-Yang é um símbolo chinês cuja origem se perde literalmente nas improváveis esquinas do tempo. Trata-se de um círculo dividido em duas partes iguais por uma linha curva e significa a união perfeita dos opostos, principalmente da mulher, Ying, e do homem, Yang.

Segundo os taoístas, e creio que poucos imbecis ousarão duvidar disto, quando Yang e Ying se amam, o orgasmo de ambos os transporta para outra dimensão, a dimensão de total harmonia com o universo.

Ou, como eu coloquei num romance chamado O Acrobata Pede Desculpas e Cai: “E é neste momento, da união mais profunda, que eu e a mulher sentimos a presença de Deus”. Pode ser pouco carola, mas sem dúvida é muito católico, no sentido universal do termo. Se Deus houvesse feito o sexo apenas para efeitos reprodutivos não faria do ato sexual a coisa mais gostosa do mundo.

Mas voltando ao Ying-Yang: os taoístas achavam que tudo que fosse humanamente possível devia ser tentado para que a trepada entre um homem e uma mulher fosse a mais harmônica e transcendental possível.

Eis o que diz o já citado neste ABC, TungHsuan Tzu, no século VII, em seu livro A Arte de Alcova: “Todos os homens têm obrigação de conhecer os diversos modos de se ter prazer com uma mulher. Ele deve saber os diversos modos de deitar (se de frente ou de lado, se sentado ou de pé) e escolher o momento exato de preferir a parte da frente ou a parte de trás: de penetrá-la violenta ou suavemente. Se souberem, viverão felizes. Caso contrário, perecerão miseravelmente”.

O Livro dos Ritos diz o seguinte: “Não basta ao homem saber fazer amor bem. Ele deve fazer amor com frequência. Até os cinquenta anos o homem deve entrar no pavilhão do prazer de suas mulheres pelo menos de três em três dias. Deve entrar no pavilhão de suas concubinas pelo menos de cinco em cinco dias. No pavilhão das outras mulheres da sua casa, quando lhe der na telha. A esposa principal deve permanecer na alcova enquanto o marido estiver fazendo amor com uma concubina de extração inferior. Depois do ato a esposa pode mandar a concubina embora e ficar no quarto com o marido pelo resto da noite. Sua posição merece honra e respeito”.

Se isto deixar as feministas menos irritadas, devo informar que Mao Tsé Tung não concordava com esta trepação toda e acabou com a alegria fodal da classe dominante chinesa. É que para os pobres da China, desde sempre, durante dezenas de séculos, sexo era “papai-mamãe e vamos trabalhar que o dia tá raiando”.

Estou, porém, de acordo com o imperador Huang Ti que mais de 2 mil anos antes de Cristo, no primeiro livro de sacanagens jamais escrito, sentenciava: “Se queres conhecer o cérebro, investiga-o com o sexo”. Que é que vocês acham? Ele estava se referindo ao pentelho luminoso ou à foda cerebral?


YOUNG, Brigham (1180-1877) – Tremendo cara de pau, foi o segundo presidente da igreja mórmon e o responsável pela transferência dos fiéis de IIlinois para Utah, nos Estados Unidos. Através de Smith, o primeiro presidente, Young descobriu no livro dos mórmons a necessidade de casamentos múltiplos. De todos os mórmons foi o que mais praticou o que pregava. Tinha cerca de setenta mulheres.

Conhecido como o “Leão do Senhor”, o pastor Young mandou construir uma casa enorme num quarteirão central de Salt Lake City e nela nunca dormiam menos de doze esposas ao mesmo tempo. As demais tinham casas monogâmicas espalhadas pela cidade, onde esperavam a eventual visita do marido.

Quando Young decidia com que esposa ia passar a noite, marcava a porta do quarto dela com uma cruz de giz. Antes, porém, comia duas dúzias de ovos “para aumentar a minha virilidade”. Não é à-toa que, apesar do manto religioso que envolve a cidade, ainda recentemente disseram que se alguém pusesse um teto sobre ela, Salt Lake City seria o maior bordel do mundo.


YPACARAI Lago ao sul do Paraguai, com 12 quilômetros de comprimento e 6,5 de largura. Tornou-se famoso no Paraguai, no Brasil e até mesmo nos Estados Unidos graças à uma guaraña na qual o compositor narra as sacanagens que fazia com uma índia chamada Cunãtaí. A música diz, entre outras coisas: “En una noche tibia nos conocimos junto al lago azul de Ypacaraí. Tu cantabas triste por el camino, viejas melodias en guarany”. Sentiram a falta de vergonha?

Aliás, as sacanagens junto ao lago azul de Ypacaraí não vêm de hoje, uma vez que recentemente foram encontrados fósseis de homens e mulheres pre-históricos às suas margens.

Passei a simpatizar mais com o Stroessner, ditador do Paraguai, depois que ele mandou explodir o filho da puta do Somoza, que andava levantando a asa para a nora dele.

Ainda assim acho que, em vez de ficar comprando terras no Paraná (para onde pretende fugir quando quiserem pregar seus ovos num muro), deveria fazer uma campanha chamada “Venga amar en Ypacaraí”, uma vez que no Paraguai existem oito mulheres para cada homem.


YÜGEN – Este Yügen aí tem trema. Aviso porque editor brasileiro acha que trema é como fio dental em bunda de mulher: se tirar não faz a menor diferença. Se o Yügen não tiver trema, vocês podem parar de ler por aqui, pois continuar dá azar. Se tiver trema podem prosseguir, pois todos os desejos de vocês serão atendidos.

Yügen é um termo japonês indefinível que se refere a uma qualidade especial de beleza ou de essência estética, cujo significado é misterioso e profundo como, aliás, tudo o que aconteceu no Japão depois da invasão dos jesuítas, dos transistores e do software que, como todos sabem, quer dizer vara borrachuda.

Se vocês quiserem maiores informações procurem se familiarizar com a obra do dramaturgo Zeame Motokiyo. Yügen, quando não é marca de queijo, é palavra doce que traduz muito amargor; Yügen é como se fosse espinho cheirando a flor. Leu sem trema? Fudeu-se.

ABC do Fausto Wolff (Parte 80)


XANTIPA (Fim do Século V a.C.) – Mulher do filósofo Sócrates. Era feia, chata e forte. Vivia cobrindo o Só (para os íntimos) de porradas. Apesar disso, ele conseguiu ter três filhos com ela.
Há quem diga que Xantipa o aporrinhava porque, em vez de ficar em casa, ele vivia batendo papo e coxas com os rapazes nas saunas de Atenas, papos sobre Ética, Estética, Verdade, Virtude, conforme Platão anotou tão bem em seus Diálogos.

De lá para cá, se excetuarmos Leibniz, Kierkegaard, Marx e alguns poucos outros, nada mais se fez em matéria de filosofia.

Se o Sócrates era chegado a uma mandioca entre uma aula e outra? Era.

Aliás, foi condenado por corromper a juventude. Deram-lhe amplas possibilidades de fugir, mas ele preferiu beber veneno (cicuta) a voltar para Xantipa, que jamais imaginou que mais de 2 mil anos depois iria aparecer neste ABC só por sacanear o marido.


XANTORRÉIA – Perdão, leitores, menti. No verbete anterior eu disse que Xantipa só apareceu neste meu livrinho porque sacaneava o bom Sócrates. Em verdade ela só faz parte desta seleção de vocábulos, acontecimentos e personalidades porque seu nome começa com “X”. Se um sacanólogo fosse depender da letra “X” para viver, não daria pra média, pão e margarina.

É que essa letrinha, além de dar nome ao cromossomo feminino XX, só é chegada à química e aos povos incas, astecas e maias, que os espanhóis do século XVI gostavam de chacinar em nome de Deus, porra!

Depois da Xantipa e antes de encontrar a xantorréia, eu só conseguia lembrar de um carteiro chamado Xavierzinho, que gostava de pegar nos pauzinhos da gurizada da avenida Farrapos em Porto Alegre, durante os anos 40.

Nunca me aproximei do Xavierzinho, mas os meninos de oito a dez anos contavam que a coisa era nesta base: “Quer uma balinha? Então deixa eu segurar o pintinho”.

Quase tão sacana quanto o Xavierzinho, que hoje já deve estar morto ou, pelo menos, aposentado de suas funções de correio da manhã viadal, é a xantorréia, também conhecida como xantorreia australis.

Trata-se de um cacto típico das regiões desérticas da Austrália. O tronco é muito grosso e curto e termina num tufo floreáceo. Do meio deste tufo se levanta uma inflorescencia longa, reta e dura.
Dizem os aborigines (aquele pessoal que gosta de furar os lábios com ossos e que come lagartixa crua) que a xantorréia é a sua única atração turística.

Baitolos milionários do mundo inteiro aparecem por lá apenas para enfiar a inflorescência no rabo e morrer com o próprio cheio de espinhos, com um sorriso nos lábios. Deve ser simpatia.


XINGU O rio Xingu, como todo mundo que estudou geografia no primário já devia ter esquecido, passa pelo Mato Grosso e pelo Pará. Juntamente com seus afluentes, acaba desembocando seus 1.980 quilômetros no Amazonas, ao sul da ilha Grande de Gurapá.

O Xingu foi explorado pela primeira vez pelo etnologista alemão Karl Von Steiner, por volta de 1884.

Dá o ar da sua graça neste ABC porque em 1959, fazendo uma reportagem para a revista Manchete (tinha esperanças de acabar na Academia, como o Arnaldo Niskier), deparei com alguns puteiros bem pobrezinhos às suas margens.

A periguete, fui ver as moças, que vinham de longe e cobravam caro para atender à clientela composta quase que exclusivamente de mineradores.

Quando disse à moça que estava na cama comigo que queria algo mais que papai-mamãe, ela me mandou à merda.

Disse: “Eu sou puta, mas tenho noivo e minha boca é só para ele”. Devia tomar lições com algumas senhoras da sociedade carioca.

Ficamos no papai-mamãe e não peguei gonorréia. Fazia-se chamar Tânia Verônica, mas em verdade se chamava Das Dores. Era sarará e tinha um dente de ouro.


XOCHIQUETZAL – Deusa asteca da beleza, do amor sexual, das artes, associada também às flores e às plantas em geral. Na mitologia, ela teria vindo de Tomoancham, o paraíso verde do oeste. Originalmente, mulher de Tlaloc, o deus da chuva, como era boa demais, acabou sendo raptada por Tezcatlipoca, o nefando e sacaníssimo deus da noite.

Tezcatlipoca (bom nome de um jogador do Madureira para ser pronunciado por aquele cara que diz “dá-lhe garotinho!”), depois de trepadas divinas, acabou por coroá-la deusa do amor.

Em algumas regiões ela é confundida com Chalchithlicue, a deusa da água fresca. Já imaginaram esses dois fudendo: “Você é demais, Xochiquetzal!”. “Me chama de Chal-chithlicue!”. “Você é demais Chalchithlicue!”. “Bondade tua, Tezcatlipoca”.


YAB-YUM – A letra Y se amarra em clãs japoneses, arranjos florais e porcelana chinesa. Mas o Yab-Yum é do Tibete e em tibetano quer dizer pai-mãe. Na Índia, no Nepal e no Tibete é representado como a divindade masculina abraçada à sua consorte feminina.

Ela é branca e está sentada sobre as pernas dele enquanto que ele, que é escurinho, vai fundo. 
Representa a união mística da força ativa ou método (upaia) masculino com a sabedoria (praina) feminina.

Trata-se da fusão necessária para sobrepor a falsa dualidade do mundo de aparências na luta por um plano espiritual mais alto.

O uso da união sexual como símbolo da união mística vem do tantra hindu e também está presente no hinduísmo, embora nunca tenha sido aceito pelos budistas da China e do Japão. Ignoro a razão deste caretismo sinonipônico.

ABC do Fausto Wolff (Parte 79)


WEST, Mae (1892 ou 1893-1980) – Mulher incrível, totalmente sem preconceitos, foi perseguida por mais de quarenta anos pela liga da moral americana, por insistir em mostrar no palco e na tela o que as moralistas mostravam entre quatro paredes.
Entra neste meu ABC porque – segundo as suas palavras – foi a mulher mais fudida do mundo. Explico: em sua autobiografia ela declarou que um homem chamado Ted fez amor com ela durante quinze horas sem parar nem para tomar um cafezinho.
Como só publicou o livro aos setenta anos, a esta altura o Ted, que tinha quinze mais do que ela quando a sessão fodal ocorreu, já não dava nem mais para o cafezinho.
Se Mae foi comida por mais tempo, sua coleguinha Clara Bow foi comida por mais gente ao mesmo tempo: teria dado num dia para todo o time de futebol da Universidade da Califórnia, reservas incluídos. Ao todo, quarenta armanhos em doze horas.


WHITMAN, Walt (1819-1892) – O maior poeta americano do século XIX, se considerarmos Pound um poeta do século XX. Era enrustidão, mas o seu livro mais conhecido, Leaves of Grass (que começou com uma edição de noventa páginas e acabou com mais de quatrocentas nas edições subsequentes), não deixa dúvidas sobre suas preferências.
Observem este pedaço de poema: “E quando eu pensei que meu querido amigo, meu amante, estava a caminho (o texto original é o seguinte: “And when I thought, how my dear friend, my lover was on his way comming...”, que alguns mais sacanas podem interpretar como “E quando eu senti que meu querido amigo, meu amante, estava para gozar...), Ó, então eu fui feliz! Pois aquele que eu mais amo dormia ao meu lado sob a mesma coberta na noite fria. No silêncio do outono, a sua face se inclinava em minha direção e o seu braço descansava suavemente sobre o meu peito – e naquela noite eu fui feliz”.
Era muita viadagem dele querer esconder a viadagem. Mas ele não era exatamente uma bichona louca, dessas que não podem ver uma fita no meio da calçada sem botar no cabelo. Ao contrário, quando John Symmons, poeta menor e baitolo maior, tentou fazê-lo confessar o coleguismo, Whitman, que era forte pacas, lhe deu um cacete pouco poético e ainda berrou: “Como é que este sacana tem coragem de me chamar de bicha? Logo eu que fiz mais de seis filhos ilegítimos?”
Grande poeta ou não, forte ou não, pai ou não, a verdade é que Whitman, se não enfornou muitos robalos, pelo menos um ele meteu no forno. O robalo de Peter Doyle, um cocheiro de bonde a cavalo.
Uma noite, em 1867, Doyle estava conduzindo o seu bonde quando notou um único e silencioso passageiro. Como Doyle também estava se sentindo entediado, decidiu levar um papinho com o passageiro solitário que – vocês já devem ter percebido – era o poeta. Foi amor à primeira vista.
Doyle botou a mão nos joelhos de Whitman, que decidiu não desembarcar no fim da linha. Desembarcaram juntos muito felizes horas depois e felizes viveram juntos durante vinte e quatro anos (é isto mesmo!) até a morte de Whitman.
Aliás, depois da sua morte, vieram à tona as suas cartas, nas quais o poeta chama o cocheiro de “meu menino querido” e se despede sempre com muitos beijos. Quando perguntaram a Doyle sobre as mulheres na vida de Whitman, ele não gostou e limitou a comentar: “Walt não era chegado”.


WIG CLUB – Rico, quando não está sacaneando pobres, tem muito pouco para fazer e morre de tédio. Uns aristocratas vagabundos de Londres, por falta de coisa melhor, decidiram fundar em 1767 o Wig Club, ou seja, Clube da Peruca.
O nome do clube onde os sacanas comiam suas amantes se deve ao fato de seu símbolo ser uma cabeleira feita dos pentelhos das amantes de Charles II, rei da Inglaterra e tremendo garanhão. Aos pentelhos das amantes do rei, os nobres juntaram os pentelhos das suas amantes.
Aliás, nego só podia entrar para o clube se junto com os pentelhos da amante trouxesse também uma declaração dela mais ou menos do seguinte teor: “Venho através desta confirmar que os pentelhos trazidos para o Wig Club pelo lorde Moray foram raspados da minha vagina”. Seguia-se a data e a assinatura.
O clube acabou quando este mesmo lorde Moray pediu demissão e levou consigo a longuíssima peruca.


WOLSEY Thomas (1475-1530) – Cardeal e estadista que dominou o reinado de Henrique VIII. Era um bom filho da puta e subiu à custa de intrigas. Além de ladrão, ainda se dava ao luxo de ter filhos ilegítimos. Os nobres não gostavam dele porque era filho de um açougueiro. Tinha grande influência sobre o rei, que preferia fuder e deixar os negócios da corte a cargo do cardeal, entre 1515 e 1529.
Oficialmente, ele foi julgado e condenado, por não ter conseguido fazer com que o papa permitisse que Henrique VIII se divorciasse de Catarina de Aragão para se casar com Ana Bolena (que devia ter uma chave na xota, pois além de feia, tinha seis dedos numa mão).
Extra-oficialmente, o rei teria ficado puto dentro das calças ao descobrir que a sífilis que tinha lhe fora transmitida pelo cardeal. É que a fim de botar no popô dos seus inimigos, o cardeal passou quase quatorze anos cochichando no ouvido do monarca. Sua saliva teria transmitido a sífilis.
Sifilítico ou não, a verdade é que o rei casou com Ana Bolena, mãe da futura rainha Elizabeth, e depois mandou decapitá-la. Reinou ainda dezoito anos depois da morte do cardeal que ele ia mandar matar de qualquer maneira, caso ele não houvesse morrido de cagaço ao ser chamado pelo rei para ouvir a sentença de morte.


WOOLF, Virgínia (1882-1941) – Maluquete, mas trabalhava bem as pretinhas (as teclas da máquina de escrever) e foi, juntamente com Proust, Kafka e Joyce, uma das pioneiras da literatura moderna. Fora de brincadeira, quem não leu a obra dos quatro não pode nem começar a pensar em discutir literatura do Século XX.
Proust entregava o anel e escrevia muito, Kafka provavelmente morreu virgem e Joyce era taradão: andava com as calcinhas usadas da mulher pelas ruas de Dublin. Virginia aparentemente não gostava do esporte, mas se tivesse que ir para a cama com alguém preferia que fosse uma mulher.
Seu desinteresse pelo sexo oposto devia-se a seus dois meio-irmãos, também meio-babacas, Gerald e George Duckworth. O primeiro tinha mais de vinte anos quando começou a boliná-la e olhem que ela só tinha seis aninhos.
Até os vinte e dois anos ela aguentou as visitas de George à sua cama. Discretíssima, não dizia nada, mas no íntimo a raiva contra mastruços e mastrucinhos crescia como urtiga.
Juntamente com os irmãos fez parte de um clube de intelectuais de Cambridge, o Bloomsberry, cujo hobby era sacanear as pessoas sérias.
Uma vez, disfarçados de árabes, fizeram uma visita “oficial” a um vaso de guerra britânico e receberam as honrarias estabelecidas pelo cerimonial. Comeram, beberam, se divertiram e depois deram no pé.
Não posso, realmente, lhes assegurar se ela era bonita, mas classuda ela era. Embora meio nariguda, tinha o olhar misterioso da nossa poeta maior, Cecília Meirelles.
Aos vinte anos se apaixonou por Violet Dickenson, que tinha trinta e sete. Escrevia-lhe cartas na base de “meu amor”, “minha mulher”, “beijo-te as mãos, os lábios e...”
Embora este “e” pareça muito loquaz, quem conheceu a dupla garante que elas não foram para a cama.
Fazia parte do Bloomsberry Club um viado chamado Lytton Stachey, conhecido como arquisodomita. Ele propôs casamento a Virginia em 1909 e ela chegou a ficar assanhada com a ideia, pois a bicha tinha fama de ser uma intelectual brilhante.
No dia seguinte, porém, o “ele-ela” disse para o “ela-ele”: “Não vai dar, meu bem. Não suporto mulher me beijando”.
Entretanto, foi Lytton que sugeriu ao escritor e ativista político Leonard Woolf que namorasse Virginia. Ele namorou, noivou, casou (foi assim que ela virou Virginia Woolf, pois antes era Virginia Stephen) e até trepou com ela. Ela gostou do namoro, do noivado, do casamento, mas detestou a trepada.
Apesar disso – ao modo deles –, eles se amavam. Infelizmente, ao fim de cada romance – escrevia, pelo menos, um por ano –, ela tinha acessos de loucura, sofria de melancolia e era internada em sanatórios.
Sua grande paixão em termos sexuais (foram para a cama umas vinte vezes, realizando lutas aranhais extremamente bem-comportadas) foi uma lésbica, igualmente casada, chamada Vita Sackville-West, que outro dia estive lendo e que escrevia direitinho.
Vita, além de despertar tesão em Virginia também despertava inspiração. Ela foi a musa do seu romance mais conhecido, Orlando, uma biografia de Vita, vista como um adolescente, em forma de ficção.
O marido de Vita, Harold Nicolson, disse que Orlando foi a carta de amor mais longa e charmosa da história da literatura ocidental.
O marido de Virginia também não se importou, pois afinal de contas “Vita é bonita, inteligente e no meio das pernas tem um clitóris”.
Embora deixasse escrito para o marido que “nunca houve no mundo duas pessoas mais felizes do que nós”, um dia, depois de uma crise de angústia, Virginia encheu os bolsos de pedras, entrou no rio Ouse e morreu discreta e elegantemente.