sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

ABC do Fausto Wolff (Parte 41)


KNICKERBOCKERS – O pseudônimo de Igor Cassini (ou teria sido o do irmão dele, o Oleg?) quando escrevia para o New York Times, na época em que este negócio de coluna social estava na moda em outros países, além do Brasil, era Cholly Knickerbocker. Parece coisa de viado e vai ver o nosso Cholly era chegado a uma big chiba!
Mas não era sobre este Knickerbocker que eu queria falar.
E lembrando isso dirijo a minha untuosa pena diretamente para você, leitora amiga que me lê – olhos súplices e grandes lábios de mel úmidos – neste momento.
Já houve uma época, querida, em que as mulheres não usavam calcinhas como estas que você está usando agora. Ou não está?
Até 1850, por baixo dos vestidos e das anáguas (moças e coroas e velhas), era tudo índio.
Não cobriam a parte mais nobre do todo delas, como acontece hoje em dia. Quero dizer: hoje em dia cobrem quase nada, tanto que usam nos países baixos aqueles bigodinhos que o Chaplin e o Hitler usavam debaixo do nariz.
Dizem que, em 1852, o Dr. Tilt, ginecologista da moda em Londres, estava sem assunto e decidiu que deveria ter sua memória execrada por este cronista mais de 130 anos depois.
Adivinhem o que fez: aconselhou suas clientes a usarem calças, por baixo dos vestidões para não apanharem, adivinhem o quê? Pneumonia, porra! Fez uma ligação direta entre a xota e os pulmões, o apedeuta!
As primeiras calcinhas em verdade eram calções, pois eram estritamente utilitárias.
Logo algumas “cabecinhas a serviço do bem” começaram a funcionar e surgiram as knickers, como foram batizadas, em todos os matizes e vinhetas diversas.
A primeira providência, por comodidade talvez, foi deixar o que fica entre as pernas – e garanto que não estou falando dos joelhos — completamente livre.
As calças protegiam, em verdade, só as coxas, a barriga e a bunda – por causa do resfriado, percebem? –, mas era possível manter relações sexuais sem tirá-las.
Apesar dessas facilidades, pessoas inteligentes e de bom gosto continuaram a lutar contra a nova moda.
Em 1855, o rei Vitório Emanuel, da Sardenha, viu uma dama de companhia cair no chão durante uma recepção em Paris e comentou com a mulher de Napoleão III que estava ao seu lado: “Estou contente em comprovar, madame, que as damas francesas não usam essas malditas calças como as inglesas e mantêm abertas constantemente as portas do paraíso”.
A História não registra a resposta da imperatriz.

KRAFFT-EBING, Richard von (1840-1902) – Se interessava muito por todo e qualquer tipo de sacanagem, mas não era um verdadeiro sacana, no que o termo possui de intrinsecamente positivo. Aliás, era um sacana, sacana mesmo! O estilo deste alemão rico e aristocrata nascido em Mannheim é muito bom, mas o conteúdo, se entendido ipsisliteris, pode formar muitos maluquinhos cun Iode.
Como Krafft-Ebing não tinha nada de mais interessante para fazer, resolveu ser neurologista e psiquiatra. Aos vinte e nove anos já era professor na Universidade de Estrasburgo.
Especializou-se nos aspectos legais da insanidade e, graças a isso, sempre que alguém cometia um crime com conotações sexuais, era chamado ao tribunal para dar a sua opinião.
Colaborou muito para fazer da sexologia uma ciência, mas parecia acreditar que, como a aritmética, ela era uma ciência exata.
Daí classificar a teoria da sexualidade infantil de Freud (não era Freud que tinha a sexualidade infantil, mas sim havia escrito uma teoria sobre a sexualidade infantil. Entenderam ou devo ser mais explícito?) de conto de fadas.
Em seu livro Psychopathia Sexualis, ele demonstrou ser um excelente colecionador de casos bizarros, que catalogava com o cuidado digno de um maníaco sexual sob os rótulos de homossexualismo, fetichismo, sadismo, masoquismo, et genitalia.
Ao contrário de Havelock Ellis, que gostava que as moças fizessem pipi em cima dele e via as vítimas de anomalias sexuais com simpatia, Krafft-Ebing não dava colher de chá para os que iam além da posição sacerdotal (ver verbete de Kichizo, Ishira).
Em seu livro ele conta o caso de um rapaz que, muito poeticamente na opinião do locutor que vos fala, tinha uma ereção sempre que beijava uma rosa.
Pois bem: o nosso psiquiatra alemão informou ao moço que se ele não parasse de beijar flores iria acabar como um cara que havia assassinado seis prostitutas em Londres para ver como eram os intestinos delas.
Provavelmente referia-se a Jack, o Estripador, que não verbetei neste livro porque ninguém sabe nada sobre esse maluco.
Como todo calhorda, Krafft-Ebing também era inimigo da masturbação, em cuja prática ele via a origem de todos os males. E eu que acabo de bater uma punheta na esperança de verbetar este verbete com mais molho do que o verbetado merece!
Dizia Krafft-Ebing que conhecera uma menina cujos pais não a proibiram de siriricar-se quando tinha sete anos. Aos onze, apesar deles colocarem uma chapa de ferro quente em volta do seu clitóris, “ela continuou praticando o abominável vício”.
Só parou quando lhe extirparam o clitóris, que alguns microcéfalos da nossa melhor sociedade insistem em chamar de clítoris porque são muito púdicos em vez de serem simplesmente pudicos.
Esteja ele onde estiver (no céu, quizas!), deve estar muito puto dentro das calças por saber que seu livro continua sendo publicado, não por seu interesse científico, mas por que estimula o fã-club de Onan, que, por sinal, não era onanista.
Disso falaremos na letra “O”, aquela em que a Maria Candelária caiu de pára-quedas!

LACLOS, Pierre Choderlos de (1741-1803) – Em 1782 sentou o rabo numa cadeira... Como? Não, seu berôncio, não sentou o rabo numa cadeira e disse: “Tu ficas aí, Rabo, que eu já volto”. Sentou o rabo numa cadeira e escreveu Les Liaisons Dangereuses. Claro que deu bode. Pois não tratava de relações perigosas? Um dos romances mais importantes já escritos na França, foi condenado pelos moralistas (da casa para fora) como obra de aviltante imoralidade. E existe imoralidade que não seja aviltante? As autoridades francesas eram tão cloacinas que acabaram proibindo e confiscando o livro em 1824 através de um decreto-lei (pqp!).
E de que trata a novela do Lolô? Das sacanagens do visconde de Valmont e da sua cúmplice, a marquesa de Merteuill.
Eis o esquema: o visconde arrumava amantes para a marquesa e a marquesa arrumava amantes para o visconde, ou seja, uma mão lava a outra.
Depois os dois se encontravam na cama e ele contava para ela o que fizera com as outras e ela contava para ele o que os outros haviam feito nela.
Evidentemente, havia um código ético que norteava ou sulava as ações do casal: sempre que um não gostava da (do) amante do outro, a regra era puxar o trem.
Embora a dupla acabe sendo castigada (ele morre num duelo e ela, prosaicamente, de varíola, não se pode dizer que a virtude triunfe na novela de Laclos que, se não me engano, foi traduzida por Carlos Drummond de Andrade, que não era de traduzir nada que fosse menos que uma obra de arte), tanto o visconde como a marquesa são personagens inteligentes, brilhantes, irônicos, cheios de savoir-faire.
Já os assim chamados personagens positivos são sandeus estúpidos e tão expressivos quanto a parte inferior de uma caixa de sapatos.
O que encheram o saco do Laclos por causa da novela eu nem conto, para não encher o saco de vocês.
E tudo porque ele contou as sacanagens de um casal; sacanagens que fariam morrer de rir os profissionais do esporte que frequentam as colunas sociais do Zózimo e do Ibrahim.
Aporrinhado, Laclos casou-se com a mulher com quem vivia já há dois anos, teve um filho e se transformou num marido exemplar.
Para mostrar que tinha defeitos, além de escritor era general de Napoleão.

Infelizmente, em 1959, Roger Vadim dirigiu um filme baseado na novela que nem a presença de Gerard Phillipe conseguiu salvar.

Nenhum comentário:

Postar um comentário