FANNY
HILL – Em 1952 meu pai tinha uma barbearia na Avenida
Farrapos, em Porto Alegre. A família morava nos fundos. Uma noite,
meus pais haviam ido ao cinema, meus irmãos mais velhos a um baile
(havia bailes, moças virgens, noivados e bons sambas naqueles
tempos) e eu ficara em casa sozinho. Tinha menos de doze anos e
comecei a mexer nas gavetas do salão de barbeiro e encontrei um
Iivro. É este mesmo que vocês estão pensando: Fanny Hill ou
Senhorita Volúpia.
Como
não manjava picas de inglês, não sei se a tradução era boa, mas
uma rápida olhada fez com que eu compreendesse que eu e a Fanny
seríamos amigos durante muito tempo.
Poucos
seres humanos bateram tanta punheta como eu dos doze aos quatorze
anos lendo este livro proibido escrito por Henry Cleland em 1749 e
que é, sem dúvida, a novela erótica mais famosa e mais publicada
no mundo. Mais mesmo que a tradução de Richard Burton – o explora
dor, não o ator que dividia o cobertor com Elizabeth Taylor – das
Mil e Uma Noites.
Cleland
a vendeu por vinte libras a um dono de livraria que logo compreendeu
o tesouro que tinha nas mãos. Publicou o original e, em menos de um
ano, ganhou mais de 10 mil libras. O livro imediatamente foi
traduzido para dezenas de línguas e continua vendendo, pública ou
clandestinamente, em todo o mundo.
A
história é singela: trata de uma jovem que sai do campo para a
cidade grande e acaba num bordel, onde se apaixona por um cliente.
Até casar com ele a sacanagem deita e rola.
Confesso
que me apaixonei por Fanny Hill, quase duzentos anos mais velha do
que eu. A traía de vez em quando com a Lady Chatterley do D.H.
Lawrence.
Só
parei de homenagear Fanny e Lady Chatterley mais de duas vezes por
dia quando uma senhora, mãe de um amigo meu, se apiedou das minhas
olheiras e me levou pra cama dela. Poucas vezes fui tão feliz na
minha vida.
Ah,
ia esquecendo: em 1964 Fanny Hill foi publicado na Dinamarca,
oficialmente. O editor foi processado e absolvido, o que fez com que
um ano depois a Dinamarca se tornasse o primeiro país a abolir
completamente a censura. Não é à-toa que vivi lá quase dez anos e
tenho uma filha dinamarquesa.
FARAÓ
– Botequim pé sujo na Rua do Lavradio, ao lado do famoso Bar
Brasil e perto da Tribuna da Imprensa, de propriedade do China. É lá
que às vezes me reúno com Machadão, Albino Pinheiro, Ferdy
Carneiro, Chico Paula Freitas e outros membros da Academia Boêmia de
Letras para conversar fiado e tomar caldo de feijão com cachaça
Rainha.
Falar
em cachaça Rainha, tremenda sacanagem a tua, hein, ô Severo Gomes,
não ter dado nota 10 para ela. Este verbete, entretanto, não é pra
falar do Faraó, cujo nome, decidi, é em homenagem ao melhor
cartunista do Brasil – Nássara – e sua marchinha Ala-la-ô,
mas pra falar de outro faraó, bem mais sacana.
Refiro-me
ao Ramsés III, que viveu entre 1.200 e 1.100 a.C.
Por
que eu sei que ele era sacana? Porque na biblioteca de Turim está
conservado um papiro da vigésima dinastia egípcia.
É
a história em quadrinhos mais antiga do mundo e é uma história em
quadrinhos de sacanagem , pois alguns dos doze desenhos mostram o
faraó sendo carregado para a cama por duas jovens. Uma terceira
carrega a sua enorme piroca e uma quarta o aguarda no leito.
Rendo
aqui minha humilde homenagem ao velho Ramsés que, em vez de uma
história em quadrinhos de guerra (como os desenhos animados de
televisão americanos que imbecilizam milhões de crianças
diariamente), nos brindou com uma história em quadrinhos de
sacanagem, no bom sentido, naturalmente.
FARUK
I (1920-1965) – Deste só não se pode dizer que foi um
pobre idiota porque foi um rico idiota. Era promíscuo, gatuno,
glutão e temperamental. É incrível que o povo egípcio tenha
aguentado este filho da puta como rei de 1938 a 1962.
Promíscuo
porque, apesar de casado duas vezes e ter tido três filhas, comeu
segundo ele – mais de 5 mil mulheres. As que não queriam dar ele
mandava raptar e levar para um dos seus inúmeros haréns.
Nenhuma
das mulheres com quem foi para a cama (nem ao menos uma atrizinha
italiana de terceira com quem estava quando morreu em Roma) disse que
ele entendia do riscado. É que embora tivesse 1,83m de altura e 136
quilos de peso, seu pauzinho perdia-se entre as banhas.
Gatuno
porque não só roubava do povo em impostos como tinha mais de cem
automóveis de luxo, todos pintados de vermelho. Mandou proibir que
qualquer cidadão egípcio pintasse carros da mesma cor, para evitar
ser aporrinhado por guardas por excesso de velocidade.
Além
de roubar profissionalmente o suficiente para encher vários
depósitos com dólares, libras, marcos, francos, ouro, prata e
pedras preciosas, roubava também amadoristicamente. Pungou, por
exemplo, a carteira de Winston Churchill e a espada com que deveria
ser enterrado o pai de outro larapio, o xá Reza Pahlevi.
Quando
não estava procurando o birro para comer mulherinhas que amarrava à
cama, Faruk estava comendo comida. Pela manhã comia duas dúzias de
ovos; à tarde peixes e massas; à noite, quilos de came e nos
intervalos bombons e leite condensado.
Finalmente,
era temperamental. Quando morreu um coelhinho, ficou com tanta raiva
que esmagou um gato contra a parede.
Em
1952, quando o gordo sacana tinha trinta e dois anos, o povo do Egito
o expulsou. Foi para a Itália onde depois de alguns meses o pessoal
do Harry’s Bar, na via Veneto, quando o via aproximar-se com seus
óculos escuros, bigode à Sarney e barrigão à Delfim Netto,
comentava: “Finge que não vê; lá vem o chato do Faruk”.
Morreu
num restaurante aos 45 anos, quando metia uma garfada
de macarrão boca adentro.
Sacana, já foi tarde.
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